Analisar corretamente as probabilidades no decorrer de um carteiro de Bridge não é tão fácil como possa parecer, pois requer não só um sólido conhecimento matemático do assunto como também um conhecimento da psicologia do jogo de Bridge. Muitos, facilmente incorrem em erros de interpretação e deixam de fora aspectos de psicologia de comportamento, que devem ser assumidos neste estudo. Na verdade, probabilidades em Bridge, é um campo de estudo e de interesse mesmo para um matemático, não bridgista, razão pela qual Émile Borel, eminente professor de Cálculo de Probabilidades da Faculdade de Ciências de Paris, se dedicou em conjunto com o jornalista André Chérom, a escrever um extenso tratado intitulado "Theorie Mathematique du Bridge" que foi publicado em francês em 1940 como uma aplicação ao cálculo das Probabilidades. Neste trabalho o professor Borel praticamente exauriu o assunto, porém poucos bridgista da época o leram, e dos que o fizeram acredito que poucos realmente conseguiram entendê-lo. O livro é até hoje uma fonte sagrada no que se refere a probabilidades no bridge. Com o intuito de mostrar ao leitor alguns fundamentos básicos de como funciona a probabilidade no bridge, vamos ao longo deste texto reproduzir alguns ensinamentos do mestre Borel, de forma paulatina, até adentrarmos no estudo específico do "Restricted Choise", que irá se apresentar como um corolário do que nos ensinou Borel. Inicialmente vamos analisar alguns erros possíveis de interpretação que poderiam ser feitos nos cálculos de Probabilidades, e que está comentado por Borel, nas notas do seu livro. ERRO 1: Após de um leilão em que a dupla ESTE-OESTE (E-O) não interferiu no leilão, SUL carteira 4 Espadas e possui todas as nove maiores cartas de espadas, restando portanto entre E-O quatro cartas menores, que são: 2, 3 , 4 e 5 de Espadas. Surge então a seguinte pergunta: "Quais são as Probabilidades destas 4 cartas entre E-O ?" Para
obtermos essas probabilidades precisamos saber quantas
são as possíveis mãos de 13 cartas formadas pelas
26 cartas que sobraram para
E-O ( 10.400.600 ). A seguir precisamos calcular para cada
distribuição
possível das cartas de Espadas ( 4-0 , 3-1 e 2-2 ) dentro do
conjunto das
cartas que completam a mão, qual é a porcentagem que elas
possuem dentro do
número total de mão de E-O. As fórmulas de
análise combinatória abaixo
fazem este cálculo. C4,0
x C22,13 x
100
C
4,4 x C22,13 x 100 C4,2
x C22,11 x 100 Agrupando
agora as distribuições simétricas dos
resíduos
obtemos as conhecidas probabilidades de distribuição das
4 cartas entre E-O: O
quadro das 24 = 16 configurações
possíveis
dessas 4 cartas entre os oponentes é: Vamos agora supor que a saída foi de Espadas e que tanto OESTE como ESTE serviram uma carta, restando portanto no naipe duas cartas, que podem estar distribuídas 1-1 ou 2-2.
É evidente que algo está errado, pois é um absurdo considerar que após as duas cartas não significativas terem sido servidas a distribuição 3-1 deixou de ser mais provável. Na verdade existe um grave erro assumido na concepção do cálculo dessas probabilidades, pois após as cartas terem sido dadas as combinações de cartas foram fixadas em base as leis do azar e o azar não intervém mais após dadas as cartas, ele já pronunciou sua sentença irrevogável quando o baralho foi embaralhado e cortado, e as cartas não estão sendo redistribuídas! As cartas que vão sendo servidas entre E-O simplesmente nos dão informações para que que possamos reavaliar a probabilidade das distribuições das cartas de E-O de modo a poder eliminar as porcentagens das distribuições que temos certeza que não estão presentes. Na
verdade, o cálculo anterior, que foi feito com erro de
interpretação, ele se aplicaria para uma
situação em que após as 2 cartas
terem sidos servidas, as 24 cartas restantes entre E-O seriam
embaralhadas,
cortadas e distribuídas novamente entre E-O . Neste caso, sem
duvida, a
distribuição das duas cartas de Espadas teriam a
probabilidades: 52,170% para
1-1 e 47,826% para 2-0. Nota: o teorema ou fórmula Bayes para a probabilidade inversa, foi publicada em 1763, relacionando a probabilidade de causas desconhecidas inferidas de efeitos observados. No fundo, ele é uma simples regra de 3 aplicadas sobres as probabilidades que entram em jogo, conforme descritas abaixo: Seja p1, p2, ... pn as probabilidades (a priori) de entrada em jogo das causas c1, c2, ... cn. Seja w1, w2, ... wn as probabilidades (psicológicas) que vão ser admitidas para as causas c1, c2, ... cn, quando o evento E for observado. Desta
forma as probabilidades compostas correspondentes
serão: portanto
as probabilidades
a posteriori
Pn,
calculadas após o evento E ter sido observado, para que ele seja
devido as
causas cn, requer os ajustes que eliminam as probabilidades que
não entram em
jogo e serão portanto: Ou seja, quando w for zero significa que essa probabilidade não entra em jogo, quando w for 1 significa que essa probabilidade a priori será totalmente mantida, se w = ½ então somente a metade da probabilidade a priori deve ser considerada, etc. Voltando ao nosso caso de estudo, a reavaliação das probabilidades nos dá : 4-0
que antes era
9,5652%, ficou zero, pois ambos oponentes serviram; Logo
o que muda é o nosso conjunto universo (espaço
amostral), que deve ser calculado pela soma das
distribuições possíveis, isto
é, É interessante observar que a relação entre 3-1 e 2-0 se mantém inalterada pois não houve deleção de nenhuma das configurações que formam essas distribuições, ou seja: 49,7391%
( probabilidade a priori)
55% (a posteriori) o que, por questão de bom senso, era de se esperar. Vejamos agora uma aplicação do que falamos : Temos um naipe com AKJ108 na mão e 9765 no morto, totalizando 9 cartas, onde falta 3 cartas pequenas e a Dama. Após batermos o Ás tanto ESTE como OESTE servem uma carta pequena. Assumindo que E-O somente descarta a Dama se ela for seca, podemos ter certeza que além da distribuição 4-0 não existir, não existe também as 2 configurações (uma em ESTE e outra em OESTE) que admitem a Dama seca. Logo, essas configurações devem ser deletadas da distribuição 3-1. Recompondo
as distribuições temos : portanto
nosso conjunto universo ficou 40,6957 + 37,3043 =
78,00 logo: Conclusão:
embora a distribuição 3 a 1 tenha maior
probabilidade inicial, ao se eliminar duas de suas possíveis
configurações a
probabilidade 3 a 1 possível diminuiu, donde fica evidente que
ao se jogar por
Dama segunda. há uma pequena chance a mais que fazer finesse
para jogar
por Dama terceira, razão pela qual com 9 cartas no naipe, quando
os oponentes
não interferem no leilão, devemos jogar pela queda da
Dama segunda. Ou
seja, numa situação,
como descrita acima,
onde o carteador põe o Ás de NORTE e ESTE serve o Rei de
Copas, está claro
que esse Rei deve ser seco (ou seria uma jogada de um ET para induzir o
carteador a uma opção errada ? - na verdade após
esse estudo você poderá
fazer essa jogada deceptiva espetacular e salvar uma Dama segunda na
mão do seu
parceiro induzindo o Carteador). Portanto assumindo que OESTE
tem 7 cartas de Copas isso muda o modo de se estimar a chance da Dama
estar com
ESTE, pois essa informação elimina inúmeras
distribuições possíveis e
torna portanto o cálculo da probabilidade a priori incompleto
para ser usado
aqui. O carteio correto agora será bater o Ás de Espadas para ver se a Dama está seca ou se OESTE tem chicana. A seguir voltar no morto e puxar trunfo. Se ESTE servir uma pequena Espadas estaremos diante da seguinte relação: em ESTE existe uma carta de Copas e duas cartas de Espadas, logo há 10 lugares vagos para caber a Dama de Espadas, enquanto que em OESTE existem 7 cartas de Copas e uma de Espadas, o que implica em haver somente 5 lugares vagos para caber a Dama de Espadas, ou seja, a relação é de 2 para 1 (66% contra 33%) em favor da Dama estar em ESTE. O fato é que a informação com base nos resíduos de probabilidade, base dos cálculos anteriores, perderam o sentido, pois muitas das configurações possíveis foram deletadas e a nova informação, ou seja, o evento da queda do Rei de Copas, é que traduz agora uma causa significativa para o cálculo da probabilidade a posteriori, que deve agora ser feito com base do conceito de LUGARES VAGOS, que é o mecanismo matemático adequado para essa avaliação, visto que não temos condições práticas de avaliar todas as configurações deletadas. Para
se usar o princípio de
Lugares Vagos, devemos somar, para cada um dos
oponentes, o número de cartas de um ou mais naipes devidamente
conhecidos (não
se inclui o naipe se algumas cartas foram jogadas ou baldadas mas a
distribuição total não é devidamente
conhecida), mais as cartas do naipe em questão que
já foram jogadas. A seguir, subtraindo esse total de 13 temos o
número de Lugares
Vagos para conter a carta que buscamos. Enfatizamos, que na situação acima descrita, que se o ataque tivesse sido Ouros, toda análise das probabilidades mandaria que se jogasse pela Dama segunda, pois não haveria nenhuma outra informação, nenhum evento extra, que justificasse jogar pela Dama terceira em ESTE. Porém, se OESTE tivesse dado um overcall em salto fraco, por exemplo, tivesse marcado 3 Copas no Leilão, mesmo se ele saísse de Ouros, haveria então uma informação valiosa de Leilão para justificar a finesse de Espadas baseada na inferência dos Lugares Vagos. para ir para a Parte2 da Dinâmica das Probabilidades no Bridge click aqui.
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